CACAU, CHOCOLATE E CUZCUZ?

Como assim? Estes três alimentos seriam o indicativo de uma receita?

Até pode ser, mas neste contexto aqui é uma outra abordagem…

Quando me deparei com uma jornada tão especial, que é visitar o mundo do Cacau e do Chocolate do Brasil, comecei a ver muito mais do que eu havia imaginado quando este meu projeto saiu do papel e virou uma exploração real.

Meu foco sempre foram estes dois icônicos alimentos e já era claro para mim, que eles compõem algo como um “universo particular” onde temos detalhes que encontro só aqui: vocabulário, utensílios, unidades de medida, processos, história…

Sim, Cacau e chocolate tem um vocabulário próprio. Só aqui conheci palavras como “podão”, “ruma”, “meeiro”, “bean to bar”, “espalhabilidade”… entre outras tantas. É um outro país dentro do Brasil. Mede-se a força desta cadeia pelo número de produtores de cacau, hoje estimados em cerca de 90 mil espalhados pelas diversas origens. E, chocolate? O “censo” conta com muitas marcas brasileiras, que se classificam em chocolate industrial, artesanal, gourmet, fino, caseiro, bean to bar e tree to bar, além das suas aplicações como trufas, barras recheadas, bombons, ovos de páscoa. Cada dia descubro uma nova iniciativa surgindo e isto só me mostra sua força neste país.

Ah sim, e tenho certeza que brasileiros amam chocolate.

Além das particularidades, que configuram esta cadeia produtiva tão forte, encontro ainda algo mais… estão aqui outros elementos totalmente entrelaçados ao cacau e chocolate. Vejam só…

Quando dei início à Expedição, comecei a me deparar com algo que transformou minha rotina. Comecei a visualizar que nas fazendas onde me hospedo há muito mais do que vejo na roça. Ao redor das mesas, além de muitas conversas deliciosas, vieram também novos sabores. Explico melhor, talvez não exatamente “novos sabores”, mas novos hábitos alimentares que fui compreendendo a cada visita.

Por exemplo, aqui no RS eu mesma não tinha hábito de comer cuscuz. Não sabia preparar, nem sabia que vendia o ingrediente principal no supermercado local, muito menos tinha a panela específica. (sem mais comentários aqui e ponto final). Mas tudo mudou pois comecei a compreender que nas fazendas de cacau as refeições trazem um mosaico muito rico da cultura alimentar brasileira. Aprendi que comer (e comi) tubérculos pela manhã, por exemplo, vem da influência indígena na nossa alimentação. Isso, lógico já havia lido e ouvido desde a escola, mas vivenciar faz toda diferença no aprendizado. Recomendo. E, sem fazer nenhuma apologia nutricional, encontrei também benefícios para saúde em substituir o famoso “pão francês” na minha refeição matinal. Simples assim.

Além disto, nas fazendas encontrei muitas influências africanas para a nossa alimentação, seja nos nomes, que em algumas vezes tive que “treinar” para repetir, ou ainda no uso de ingredientes e na configuração das receitas. Ali, também podem se mostrar as relações da alimentação e religiosidade, tema que ainda requer mais pesquisa de minha parte.

Comecei a ver que à volta da mesa, aprendo muito! Este fato despertou minha vontade de incorporar saberes genuínos, presentes há gerações neste nosso Brasil. Desta forma, me sinto valorizando inclusive outras cadeias produtivas, como a da mandioca, do milho e de outras frutas, e por conta disto, fortalecendo minha paixão pela brasilidade.

Diga-se de passagem, a cada viagem minha, além de trazer derivados de cacau e chocolates, trago também produtos locais como polvilho, goma de tapioca, azeite de dendê, especiarias, frutas regionais secas, e assim vai. Nesta caixa que dá um certo trabalho para transportar, trago muito mais do que alimentos, carrego experiências, memórias de minhas conversas no balcão da feira, nas bancadas das cozinhas e à mesa.

Então, desta viagem toda, tenho orgulho de dizer que o Cacau e Chocolate podem ensinar a compreender meu próprio país, nossas origens, nossa História, nossa ancestralidade. Cacau e chocolate são para mim protagonistas e estão me conduzindo pela mão a desvendar ainda mais o Brasil.

Um viva ao Cacau, ao Chocolate!

Por Juliana Ustra – Viajante no mundo do cacau e do chocolate do Brasil, idealizadora do Projeto Chocolate no Brasil e da Expedição Cacau e Chocolate.

@chocolatenobrasil